quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Quebra.







     Logo de início, somos conduzidos por um automatismo inevitável, que embora pareça comum (até mesmo por não pensarmos nele), cria em todos nós um certo desdém pelo dia que está por vir. Levante com o pé direito, calce os chinelos, vá ao banheiro, lave o rosto, escove os dentes. É como se ordens fossem proferidas em silêncio, de nós para nós mesmos. Como se não bastassem as nossas próprias ações quase robóticas, tudo o que nos envolve parece colaborar para que continuemos nos levando sempre para o mesmo lugar.
     Já me conformei com o fato de que tudo o que eu disse anteriormente seja considerado, por muitos, indigno de aprofundamento. Talvez isso aconteça porque ninguém gosta pensar em quão pacatas são nossas vidas e quão triste isso é, e talvez eu pense muito nisso porque tive que me acostumar com diversos ritmos de rotina diferentes em minha vida, sendo que o atual parece simplesmente mais monótono do que todos os outros.
     Dito isso, fica mais fácil compreender a simplicidade da minha escolha em relação à experiência estética. As fotos acima representam um momento de quebra no meu comportamento rotineiro. Isso porque enquanto eu me arrastava, sem ânimo, do quarto para o banheiro e do banheiro para a sala em mais um dia como todos os outros, essa visão fez com que eu interrompesse minha próxima (e com certeza, previsível) ação. Provavelmente essas imagens não transmitam o que eu gostaria que transmitissem devido à capacidade limitada da câmera fotográfica que usei, mas serve para ao menos documentar algo que não quero esquecer.
     Enquanto eu esperava encontrar mais uma paisagem cinzenta ou prejudicada pelo excesso de luz vindo de um sol escaldante, voltei meus olhos para a janela da sala e encontrei algo novo. Uma vastidão de um azul-alaranjado que tomava a maior parte do céu, seguido pela camada de uma única nuvem, uniforme, vasta e perfeitamente reta, respeitando a camada que se seguiria abaixo, que, por sua vez, admitia um belo tom de laranja, sendo interrompido apenas pelos edifícios que tomavam uma parte do espaço. Depois dessa experiência, me dei conta de que embora a maioria dos dias de nossas vidas seja um mero preenchimento de tempo, alguns deles apresentam pequenos atrativos raros, e são eles os verdadeiros responsáveis por renovar a nossa perplexidade perante ao mundo.


Rafael de Sylos

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